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Meia Noite de Verão


Assoprei o café da meia noite, estas horas nocturnas de verão já não têm o calor que outrora tiveram e tive que ir buscar aquela manta ao xadrez que recebi no natal passado e que achei que nunca lhe daria uso. O Miguel Araújo toca em replay a "Recantiga" e tento acompanhar os violinos com um assobio.



Já passou muito tempo desde que aqui vim parar, sinto saudades e alívio ao mesmo tempo. A ausência significa que não preciso, que já passou, que acabou.
Nem sempre o coração fica com feridas por sarar, nem sempre tudo é para sempre, seja o amor ou o sofrimento. E ainda bem, não é? 
De que vale parar no tempo, convocar deuses do esquecimento se é mais fácil cair no erro para mais tarde recomeçar? Aprendi isso da melhor maneira. Não, não me enganei, foi mesmo da melhor maneira. É mais fácil usar o mal que nos aconteceu para devagar, devagarinho, chegar ao ponto de partida. Acho que já lá cheguei.
Talvez, se as minhas paredes falassem, se a minha almofada se queixasse, se as minhas unhas não fossem disfarçadas com verniz verde-água, talvez, as pessoas saberiam todas aquelas coisas tontas que eu digo e me arrependo, que eu penso e repenso. Felizmente não, assim posso guardá-las e fazer de conta que nunca aconteceu.
O café já arrefeceu e o Araújo diz que ''era de repente o rio, num só rodopio a subir o monte, e a correr contra a corrente, assim de trás para a frente, a voltar à fonte'', e só por isso, já valeu a pena voltar aqui, ao ponto de partida.




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