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Madrugadas Incertas

São 03:15h.
Parece que algo mudou, tens nos ombros o peso de uma mudança incerta.
Sentes que para aquela pessoa não tens mais o brilho que outrora tiveste, que já não é a ti que ela quer preparar o almoço para depois te acordar entre cócegas e beijos roubados enquanto te chama de dorminhoca, sabes que já não é o teu número que vai receber uma mensagem de bom dia só para te lembrar que acordou a pensar em ti ou uma de boa noite para que nas entrelinhas leias que a tua almofada devia estar ao seu lado.
É aí que vem a incerteza. A procura de respostas a perguntas que aparecem a mil de todos os lados. O que foi que correu mal? O que é que faltou? O que esteve a mais? (As pessoas esquecem-se facilmente que tudo tem de ter conta e medida, e preocupar por excesso, perguntar em excesso, estar lá por excesso, por vezes cria o defeito.) O que te vai na cabeça? Aliás, no coração? 
São 03:32h.
Deito-me e é entre lençóis e aquele arrepio nas costas que estas perguntas vão surgindo, que te apercebes que quem diz que o coração não dói é porque nunca sentiu que perdeu algo verdadeiro. Mas eu sinto, é aquilo que pensas. E continuo a sentir ou já estaria a dormir. Dou mais uma volta na cama. E outra. E outra, e outra, e outra. Por esta altura já tenho calor, puxo os lençóis para trás e lembro-me das vezes em que fui a culpada de uma cama desajeitada ou porque eu tinha calor e tu frio ou simplesmente porque fazer isso te chateava e eu achava piada.
Nem vale a pena entrar por aí, se fosse dizer todas as coisas em que te achava piada, no topo da lista estaria talvez a forma preocupada de arranjar o cabelo, a persistência para ter o toque certo. Talvez por isso, a altura do dia em que gostava mais do teu cabelo fosse ao acordar, ganhava o seu jeito mais natural que conjugado com olhos meios fechados e a voz rouca de quem já dormiu muito, fazia de ti a pessoa mais irresistível que já conheci.
Puxo a almofada talvez numa tentativa de te encontrar pelo meio e pergunto-me como serão os próximos dias.
São 03:49h.
Lembro-me exactamente do primeiro dia que te vi, a primeira vez que falámos, lembro-me de enquanto dormias olhar para ti e pensar ''É ele.''. E continuo a pensar. És tu. Quero que sejas e continues a ser. Com todo o teu ar misterioso de homem que esconde uma idade madura, com o ar de quem me tenta proteger de tudo o que pensas que pode me tirar o sono, com essa forma demasiada ajeitada que tens de viver a vida.
Aprendi que fazer planos para o futuro só vale a pena se passarem por escolher que doces te vou obrigar a comer ou que filme vamos ver no próximo serão, planear os próximos meses de nada nos vale se temos um amanhã incerto à nossa espera.
Li uma vez num livro que só há uma forma de prender aqueles que mais amamos: largá-los, deixá-los ir para onde eles quiserem, que se gostam de nós voltam sempre.
São 04:39h.
As horas voam e dou mais uma volta na cama. Acho que adormeci por alguns minutos e enquanto sonhava ouvia uma voz dizer "Acredita, todos os dias eu escolho não me apaixonar por ti. Só não tenho culpa se o meu coração é tão desobediente''.
O despertador toca e quase que consigo sentir a incerteza de um dia incerto.

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